26 de dez. de 2013

Entrega

Meus sentimentos são as minhas orações. Para os meu desejos e meus pecados, não pago penitência. Talvez eu não meça as consequências e esqueça de tudo o que me ensinaram. Sinto que já não preciso me desculpar, muito menos apagar meus sentimentos. Se o caos segue os meus passos é só uma doce coincidência. Viro personagem, um sonho de pierrot. Deixo as mãos gelarem e minha boca sorrir de um cinismo disfarçado; deixo meu olhar rasgar papéis com os quais eu sufocaria. Faço das dores físicas um pouco de poesia, me disfarço de leveza sem temer. Rio da ingenuidade alheia enquanto brinco com alguns fios de cabelo. Respiro perfumes alheios, observo passos incertos. Admiro a beleza que não veem. Não me importo com hábitos errados ou fatos passados. Não deixe teus olhos comigo, eu vejo tudo.

Senti o tempo passar rápido demais entre os meus dedos, senti meus lábios esboçarem um sorriso de aceitação. Seu eu te olhar assim de lado, acredite que nem eu sei o que estou pensando. Eu também não acredito no que desmando. Não sei explicar o que em mim está acabando.

Me deixo na parede, deixo pedaços de mim e não perco nada. Talvez eu deixe meu corpo falar, talvez eu esqueça de te avisar. Se quiser fazer de mim um violão, eu deixo.

25 de dez. de 2013

Inexorável

Jamais buscarei a perfeição. A beleza está nos tropeços.

Doces luzes longe daqui. Pequenos pedaços de vento caem ao chão, um doce acalento me toca sem existir. Um arrepio me faz fechar os olhos, uma porta bate longe, onde vozes alteradas dizem coisas que não entendo. Também não entendo a dor de virar as páginas, de olhar as paredes brancas, de sentir a água fria escorrendo no meu corpo nu. O vento quente de verão me queima a pele, uma árvore ganha vida ao tocar de leve a minha janela, eu perco a vida no doce momento do piscar dos olhos. Minha vida num reflexo de espelho, num passo que dei sozinha, nas decisões que tomei ao ser quem sou. O rasgar do peito, o destruir a pele, a dor que me tira pedaços: mas só da alma. O corpo intacto anda nas ruas, com a aparência leve e um olhar distante. São os passos firmes de quem não os controla, o correr entediante das horas. Dia e noite. Outra vez. Outra vez. A inexistência do eu ao beijar os lábios de quem nunca amei. A dor de apaixonar-me sozinha, dos amores guardar a dor ardente de um tapa que não recebi. Estrelas trocam de lugar e a minha dor continua no mesmo lugar, crescendo como um tumor maligno.

Mais uma vez o vento me abraça, apenas ele. Só eu nesse vazio, aqui me esqueço. Dói até eu esquecer da imensidão da dor. Da imensidão que eu sou em um corpo tão pequeno.

24 de dez. de 2013

Deixando-me

Deixei ficar
Feito chama escondida
Feito ferida quase cicatrizada
Num caos de acontecimentos

Deixei sorrir
Com um jeito doce de ser
De vários disfarces
E impasses

Deixei viver
Gravando nas paredes
O impossível de crer
O impossível de descrer

Deixei fluir
Entreguei os sentimentos
Nas tardes amenas
Nas curvas do meu corpo

Deixei amar
Mesmo com amanhãs
E palavras vãs
E outros afãs

Deixei morrer
Inseguranças
Terceiras cobranças
E falsas pujanças

Deixei estar
Todos os fatos
Todos os desejos
Em todas as curvas

Deixei lembrar
Das heranças
Das canções
E outras segundas intenções.

23 de dez. de 2013

Inefável

Nossas mãos
Teus beijos
Olhares
Os medos
Pilares
Desejos
Os tons
Os dons
Teu cheiro
Nossos passos
Os abraços
Risos
Disfarces
Sorrisos
Palavras banais
Sinais
Vogais
Meus sinais
Pessoas banais
Anormais
Beijos desiguais
Te quero
Sempre
Mais.

15 de dez. de 2013

Colapso

O desejo existe. E saber disso só me faz desejá-la cada vez mais. O desejo de não encontrá-la somente nas palavras, mas em uma rua qualquer; em um dia quente, perto de uma árvore. Vontade de acabar com a saudade e sentir a presença. Vontades, vontades... O que posso dizer da ligação não feita? Os dias transformaram-se em algo diferente da rotina e do passar das horas. Palavras no ar, flutuando. Sentimentos. Madrugadas. Decisões.

Amor artístico? Amor para inspirar? Amor para amar? Para saciar, variar, compensar? Amor para quê? Amar para quê?

Encontrar uma sensibilidade próxima, um sonho coincidente, uma esperança vagabunda. Um sentimento inferior de tão superior que é. Encontrar no amor, na carne, na falta de pudor? O que podemos descobrir nesse mundo repetitivo? O que posso encontrar de exclusivo em mim? O que há de novo em nossas almas?

Como podemos amar nessa cidade caótica, com esses corações de fibra ótica? Como seremos gente, como viveremos entre os que só sobrevivem? O que nós pensamos ter de diferente, para sermos assim, tão diferentes? O que eu fiz para estar nas garras do teu (des)amor?

Ainda somos humanas?

Diferença. Essa vida cheia de perguntas nesse apartamento sem mobília. O que faremos no meu ateliê-biblioteca?

Pintar esse raio de sol batendo nesse prédio cinza. Pintar esse teu corpo deitado no tapete barato. Somos corpos, apenas corpos. Somos almas, apenas almas. Estamos juntas pelo pouco tempo que o sono nos permite estar. Quatro olhos castanhos, dois corpos brancos pela falta de sol, dois sorrisos tímidos. Dois delírios perfeitamente possíveis de duas mulheres perfeitamente reais.

Insaciedade, o que nos move.

11 de dez. de 2013

Monte Castelo

Suava, o coração palpitava, a ansiedade massacrava o corpo já debilitado. Os desejos antigos pulsavam. A espera angustiante para saber o que há horas foi revelado. O susto do não, a explosão do sim.

Pela primeira vez, algo real.

Recíproco.

E, de repente, eram os sonhos escancarando as portas. A coragem desprezando o medo. A razão do quase-amor.

Era a lembrança do: Será-que-aquele-foi-o-primeiro-e-único-abraço? Tão difícil quanto o abraço dado enquanto o ônibus já esperava com a porta aberta, pessoas entrando, o vento frio trocando calor com o calor do nosso abraço meio desajeitado, em uma calçada qualquer. Longe-quase-perto de flores brancas e vermelhas. Assim como eu, longe-quase-perto de ti, de braços cruzados, esperando o ônibus partir de portas fechadas. Um apagão enquanto a escuridão da noite já reinava...

A noite tinha um céu aquarelado, um céu anoitecido e ainda com toques de amarelo e laranja.

É estar aqui, escrevendo na escuridão, e sentir o peso do teu olhar enquanto eu fingia não prestar atenção.

Coincidências.

O hiatus que tive assim que li o "Ficar contigo." foi igual ao hiatus que tive enquanto escrevia algumas dessas palavras. Foi mais do que um "Eu te amo" propriamente dito. Foi mais do que o beijo desajeitado que dei na tua bochecha enquanto te abraçava.

Não tenho mais coerência para escrever com esses pensamentos descoordenados. Não tenho mais como descrever o mais-que-um-eu-te-amo-propriamente-dito da noite de dez de dezembro.

9 de dez. de 2013

Young

São ruas vazias e escuras. Passos calmos, uma leveza um pouco nervosa. Uma certeza um pouco duvidosa. Revelações simples, coisas desconexas. O futuro ecoa na mente. A possibilidade ecoa no sorriso. As palavras escorrem pelos dedos, o coração pulsa acelerado.

Eu já não ligo mais para os meus vazios.
Eu já não ligo mais para a minha falta de nexo.
Para toda essa falta de explicação.

3 de dez. de 2013

Momento

Doce momento do cair dos traços, do cair da roupa, do desatar dos laços, do atravessar da luz. O obter do algo que por milhões de segundos foi o prazer mais desejado. E esse prazer será descartado? Caso, casual. Ver hoje, dizer adeus amanhã. Paredes brancas, cobertas de quadros, sustentada por livros, absurdo momento. Sinfonia estranha dos gritos, complexidade do que não faz o mínimo sentido. Sombras, reflexos o cair do sol. O amanhecer da noite, a hora de libertar as proibições, mostrar ao Sol o que ele nunca viu. Uns passos dançados, que não foram ensaiados. Uns passos sensuais que não pertencem a nenhum ritmo. Uma música fluindo e descompassando nossa dança. Arrepios estranhos de uma noite amena. Uma atmosfera diferente, outras almas, outras auras. O que dizer dos beijos que ainda te darei? Uns olhos que fazem cair tudo, o último véu, a última máscara. Os últimos pudores. A linha tênue da sanidade se destruindo aos poucos.

29 de nov. de 2013

Caminhos inexatos

Quinze pr'as seis da manhã.

 Já não me importo. Não tanto como antes. Os dias não são iguais. Tudo é tão mutável para mim e, aos olhos dos outros, tudo é sempre o mesmo. A luz do Sol projetada nas folhas das árvores, nos muros das casas, na fumaça dos carros. A mesma mulher loira cruza comigo no caminho da escola desde quando eu tinha nove anos. Não sei seu nome, ela não sabe o meu. Ela envelheceu um pouco, eu cresci e minha alma já não é mais a mesma. São sempre as mesmas manhãs, o mesmo ar impuro acabando com os meus pulmões e quase as mesmas pessoas passando por mim. O mesmo calor morno, o mesmo suor escorrendo no meu rosto. A mesma pressa inocente, os mesmos passos decididos. Mas tudo tão diferente, tão novo e tão estranho aos meus olhos. Às vezes, o céu escurece e cai uma chuva fininha. As pessoas fogem e eu quero mais estar no meio da rua, sentindo o frio dos pingos de chuva.

Onze e quarenta da manhã.

Sol escaldante. Planos mirabolantes para uma tarde que só me cansará. Carros, carros, carros, um olhar. Olhares fortes e algumas pessoas vazias. Pressa, sempre a pressa do meu coração vadio.


Madrugada

Overdose
Superdose
Mais uma dose do teu delírio
Mais uma dose da tua boca
Mais um segundo do teu olhar
Alguns segundos
Pequenos instantes
Alguns pares de horas nos unindo
A tua boca me sorrindo
O chão se abrindo
O teu corpo me falando
Estrangeiro sentimento
Doce acalento
Overdose
Superdose do nosso caos
O sal das lágrimas
O sal das horas
O fel do medo
Medo nos dedos
Entalado na garganta
A pureza de qualquer amor
Absurdo impossível
Sentimento impossível
Negação quase impossível
Sentimento estampado na cara
A lágrima escorrendo dos olhos
A lágrima escolhendo o caminho
Uma gota explorando o meu rosto
Vozes sufocando meu coração
Luzes cegando meus olhos
Lágrimas abrindo espaço
Overdose da tua superdose de ser
A tua intensidade me infectando
Meu coração, alma
A overdose fazendo efeito
Minha mente que não sente
Não escolhe
Só possuo minha fé
Superdose de sentimentos
O exagero das nossas almas
Não sei se é sério
Ou sono.

23 de nov. de 2013

Inefável - Prefácio


O prefácio - ainda inacabado - de Inefável. O livro que não pude terminar de escrever no mês de novembro por motivos escolares. Porém, ainda continua vivo, pulsando junto com o meu coração.
Sou uma pessoa de variados nomes, de variados sentimentos e inúmeras insatisfações. Não consigo ter um só nome, já que tantas pessoas moram em mim. Não gosto de nomes, prefiro os pronomes; só não posso dizer que amo incondicionalmente qualquer coisa que conste em uma gramática. Ajo de variadas formas e acredito que não sou uma única alma, um único corpo. Nasci mulher, mas minhas ações não são unicamente de uma mulher, de humana. Posso ser um bicho que se sente ser humano, ainda não sei. Nasci e aqui estou, escrevendo e existindo. Mas não sei se existo como as outras pessoas existem, também não sei como elas existem. Batizaram-me como Lygia, uma menina pequena, nascida quase morta. Da morte recebi um beijo e um aviso, senti seu hálito quente quando sussurrou no meu ouvido. De Deus recebi o direito de viver, mas não sei como existir, não sei como encontrar as luzes que deveriam me guiar. Não consigo explodir quando estou rodeada de silêncio e calor. Busco em amuletos a minha sorte, mesmo que não consiga acreditar neles. Calculei meus passos, mas cansei da exatidão tão sonhada. Mandam e desmandam e esquecem que eu ainda possuo o livre-arbítrio e ele devo seguir; seguir a minha falta de direção. Talvez a vida seja motor. O mundo é uma variedade de caminhos. Eu vivo para quem? 

 Vivo dias aparentemente banais, que são recheados de uma complexidade incompreensível. Ajusto relógios que não funcionam mais, elejo governantes sem que haja eleição. Vivo entre a loucura e a sanidade, não sei o que posso esperar de uma existência tão confusa. Observo detalhes, me apaixono por eles e ninguém acredita nesse sentimento. Sofro nas ruas, o sofrimento de vários agressores anônimos. 

 Abandonei tudo que me disseram ser necessário. Essa é a história de alguém que desistiu de coisas banais para entregar-se ao próprio mundo. Alguém que não teve sorte de encontrar um amor tranquilo. Há o medo e o medo de sentir medo. Há o medo e o medo dos julgamentos. Vontade de ser e explodir de tanto existir. Tenho vontade de abreviar a minha vida e desistir, finalmente descobrir se há um céu. 

19 de nov. de 2013

Fim de tarde

Por que não apenas sobrevivo
Assim como os outros?
Por que eu vivo
Como poucos?
Todos tão felizes
Com seus sorrisos fáceis
E eu vivo, quase sozinha
Entre tantos sobreviventes
Sobrevivem à margem da realidade
E vivo sentindo dor
A dor dos que não sentem
Vivo assim, sozinha.
Sofrendo atrás dos óculos
Escondendo os olhos
Escondendo as lágrimas
Disfarçando-as
Nomeando-as alegres.
Eu, triste.
Vivendo.

16 de nov. de 2013

Diário #1

Nunca tive um fim de semana tedioso, minha mente nunca está calma, não fico sentada em poltronas nas tardes de domingo. Não é uma dádiva. Nunca tive um dia perfeito, algumas horas e só. O mundo nunca é bom o bastante. Basta abrir um jornal on-line que encare o mundo com o mínimo de seriedade. Basta ter começado a brincar de sentir a dor dos outros e nunca mais parar. Ser como Drummond, ter duas mãos e o sentimento do mundo. Ser como Tarsila, amar as cores vibrantes que rotularam como feias. Ser como Leila Diniz, livre para ser mulher em uma sociedade de homens. Ser como os que vivem, não os que sobrevivem.

Quinze e dezenove

Meu peito vai explodir Mais escandaloso que sua bolha de sabão Minha bolha é quase nada Quase nada, quase tudo Representação dos extremos "O peso e a leveza" A postos, sempre os mesmos A dor e o delírio Os limites da (in)sanidade Como uma parede cinza em todo e cada amanhecer Se tocam e gritam Pr'o oco e pr'o ócio Pr'o infinito Que é bonito E necessário Se doer pr'a se viver Se não doer Haverá um vazio em cada você Que não há cor nem amor Que não há ar nem sonhar Que complete o teu ser E há sempre uma gota que me transborde Um alguém que me modifique Uma vida que me transforme, apesar do caos Que me mostre e eu goste que é no meio da loucura que se conhece a lucidez Que eu lembre que há tanta falsidade na polidez Que eu lembre que o recomeço sabe quando é a sua vez.

- Milena Moreira e Gleanne Rodrigues.

15 de nov. de 2013

Nove

Me tira o peso desse dia
Me mostra essa leveza sem fantasia
Um toque de nostalgia

Encanta-me com a tua dor
Que me dói com o mesmo horror
Que contempla com o mesmo esplendor

Aumenta os minutos dessa hora
Me faz esquecer do que há lá fora
Do que acontece agora

Visão
Paixão
Evolução

Diz que ainda te sirvo de guia
Que sou uma amnésia da tua dor
Que teu amor não me ignora

Ah! Admiração.

4 de nov. de 2013

Inefável?

Novembro chegou com uma surpresa muito agradável: o NaNoWriMoBr. É um desafio, com o simples objetivo de escrever um livro de 50.000 palavras em um mês. E claro, entrei nessa. Como é de se esperar, estarei ausente durante todo o mês de novembro para escrever Inefável, mais um dos meus livros. O desafio foi um empurrão para realizar meu sonho de escrever um livro, já que sempre desisto antes de completar três capítulos de uma história.

Para que vocês matem a curiosidade, segue um trecho do terceiro capítulo:

"Mas consigo levantar da cama onde estou, consigo caminhar e fitar-me no espelho. Ali encontro um corpo nu, quase magro, quase perfeito. Encontro um par de olhos castanhos, na boca uma cicatriz. Tento mudar a luz de posição e procuro um ângulo de iluminação onde eu consiga me enxergar. A fome massacra meu estômago, mas não consigo sair da frente do espelho. Subitamente, encontrar um reflexo, que não é fiel ao que sou. Encontrei meu eu distorcido, encontrei o corpo onde nunca habitei. Pareço ser uma alma desgarrada, é difícil acreditar que eu esteja viva, que me rotulem como humana. Serei eu uma louca? Observando o próprio corpo, suas cicatrizes e marcas dos poucos anos vividos. Curvas e mais curvas, meu corpo é uma estrada sinuosa. Tenho teto e paredes e minha sinuosidade, um corpo que não reconheço e beijos que nunca recebi. Tenho sonhos e nuvens duvidosas que passam por mim.

São ameaças de morte que circulam em uma bicicleta, ameaças de um homem loiro como um nazista, alguém que prometeu vir amanhã para acordar meus pesadelos. Alguém que pode me anular, deixar minhas dúvidas mortas com meu corpo. Mesmo que eu não saiba quem sou, tenho medo de receber outro sussurro da morte e dela ouvir a palavra final. Ódio gratuito que nele ficou gravado, ódio que pode me levar ao inferno. Mas o ódio não é garantia, prefiro acreditar em algo além da eternidade. "

29 de out. de 2013

Every teardrop is a waterfall

O mundo é diferente quando se está em um ângulo diferente. O vento frio não é o mesmo em lugares distintos. A noite está escura, mas não o bastante. Os horários são apenas pré-determinações. Músicas passam, repetem-se e caem no esquecimento. Aceitar é mera escolha.

São dez da noite e só lembro que caminhei por vários dias. Areia, suor, cacos de vidro e fuligem fazem parte do meu corpo. Provei da indiferença, comi no prato vazio da fome, caminhei ao lado da solidão... Deixei que os motoristas decidissem, desafiei o perigo em uma estrada de mão dupla. Nada era maior que o vazio que carregava em mim. Fui animal entre pessoas animalescas. Fui criminosa sem cometer crime algum. Minhas roupas e meus sapatos perderam suas formas originais, meus óculos transformaram-se em cacos numa rua vazia. Quarteirões, quadras, praças. Eu vivia sem existir. Continuo assim. A sujeira que agora faz parte do meu corpo. A sujeira foi e é meu corpo. A solidão foi e é minha companheira. 

Os sentimentos nunca foram tão reais no meu âmago. As palavras são seres diferentes do que eu imaginava. Estou em uma fase contemplativa, meu espírito é um simples ser-telespectador. Contramão. Fogo, terra, água, ar. Elementos, seres, egos, estranhos. São tantos caminhos e regredir é tão anormal. Aceitar rótulos é tão inexplicável. Somos como somos e quem somos. Contemplo e existo, independentemente da minha condição.

Recomeços são caminhos tão ambíguos, às vezes, tão estranhos. Mas, recomeçar é um ato de coragem. Qualquer ato, por mais inútil que seja, é um ato de coragem. Recomeçar é estranho aos olhos daqueles que esperam a aceitação da derrota. Uma palavra não possui apenas um significado, uma ação não possui apenas um reação.

Embora a poeira e a fuligem ainda façam parte do meu corpo, a fé que tenho na humanidade é maior que tudo. Acreditar na humanidade é acreditar em Deus.

Que eu seja.
Que tu sejas.
Que ele seja.
Que nós sejamos.
Que vós sejais.
Que eles sejam.

Amém.

23 de out. de 2013

Rótulos

O volume da tua música, teu sorriso que já não é tão branco. Tua opção sexual atribuída ao demônio. E a tua roupa nova? É original? E as tuas cores, ainda estão na moda? As tuas rugas novas e novos cremes para escondê-las. Quem passou do teu lado, como se chama o rapaz que quase caiu aqui? O teu manequim precisa diminuir, tem academia perto da tua casa. Já pensou em pintar o cabelo? Tuas unhas devem crescer, o rosto sempre maquiado, os pelos dos braços sempre descoloridos. Não esqueça de comprar uma balança. Teu celular já está ultrapassado, parece até telefone fixo. Teus filhos já viram o mais novo notebook? E os vândalos protestando não tem o que fazer? Dá esmola aos pobres? Você diz homossexuais são gente que nem a gente? Se duvidar, fazes parte do clube.

11 de out. de 2013

Bruxuleante

Estava linda sob a luz do poste da rua. Diferente de todas, passou com seu passo leve sem que nenhum homem da rua percebesse a sua presença. Uma energia diferente de todas que já senti. Parecia uma moça dos anos cinquenta, ou trinta. Não precisava de salto para estar elegante, não precisava de nada em um tom chamativo para chamar a minha atenção. Olhava para frente, não me viu. Um jeito inocente e orgulhoso de caminhar. Uma blusa branca e uma saia rodada. Branco e preto. Uma alma que transpirava pureza, cabelos lisos e uma franja no rosto. Apaixonei-me. Caminhava, na calçada, na rua. Seu lado direito iluminado, seu lado esquerdo coberto pela escuridão da noite. Queria ter a coragem de gritar: "Menina, me diz teu nome!" Com o nome dela queria batizar este texto. Com a pureza dela, purificaria o mundo. Com o rosto sério, ensinaria o mundo a valorizar a seriedade na hora certa. Foram poucos os minutos que pude vê-la. Em um segundo iluminada, no outro, ocultada sob a sombra das árvores. Os homens não viram, nem os meninos, nem rapazes. Será que só eu a vi? "Menina, me diz teu nome!" Quero que o mundo saiba da tua existência! Ela mora na mesma rua que eu, poucos metros de distância dos meus olhos. O que fará agora? Ah, como queria saber seu nome. Metade luz, metade trevas. O laranja dos postes, o negro da noite. O negro das tuas sapatilhas, da tua saia, dos teus olhos que não vi bem, dos teus cabelos. Não sorria, mas irradiava beleza. Uma vez só, pronuncie seu nome.

10 de out. de 2013

Duzentos

Pouco mais de um ano de blog e duzentos textos. Contos, poemas, textos sem gênero definido... Nunca pensei que conseguiria voar tão alto e chegar tão longe. Jamais imaginei que gostariam de ler o que escrevo sobre o que sinto, vivo e penso. Eu não sabia que, em uma bela madrugada, criaria algo para pensar em desistir quase todos os dias.

Além de duzentos textos, são milhares de palavras, infinitos sentimentos e milhões de acontecimentos. Com todas essas palavras, posso olhar para trás e ver que todo sacrifício foi válido. Posso até morrer em paz. Sei que com essas palavras serei eterna. Afinal, o maior medo do ser humano é morrer. Porém, sei que lembrarão de mim, mesmo que de um jeito torto. Também posso dizer que sou imatura demais para escrever o livro que tanto esperam. Vivi muito pouco para isso. Quero agradecer aos leitores que comentam, aos que não comentam também. Afinal, sem leitores um escritor não existe. Agradecer também aos meus amores, cada um me matou, cada um me ressuscitou. Enfim, só tenho a agradecer. O resto é solidão.

Que venham mais textos! Até o post (comemorativo) dos trezentos textos.

9 de out. de 2013

Promessas

O que você faria se eu te desse uma flor? 
Se eu te escrevesse um livro 
Te jurasse eterno amor? 
Poderia te escrever 
Contos, poemas 
Receita de liquidificador.

Me diz, tu aceitarias?
Eu deixaria minhas gírias
Deixaria meus acertos
E até meus erros eu aceitaria
Amaria meus erros
Provaria teus beijos.

Esquece, não sei
Se disso tudo gostarias
São palavras
Só palavras
Palavras que tu amarias 
Os únicos tesouros que herdei.


8 de out. de 2013

Parto

Sol em brasa, tarde quente. Corpo morno na água fria, o toque gelado dos pingos e nada mais. Incontáveis obstáculos no meio do caminho, incontáveis pessoas no meio do caminho. O olhar de cada uma delas. O que pensará cada uma delas? Olhar inseguro de mulher quase sozinha, quase vazia, quase transbordando. A tarde quente, cansaço transbordante. Asfalto fervendo, pessoas nascendo, pessoas morrendo. Dores fortes no peito, um sinal de infarto. Dores fortes no abdômen, sinal de parto. Intervalos entre uma contração e outra, pequenos momentos de paz e contato com o paraíso. Vida querendo viver, desespero começando a aparecer... Um telefone a poucos metros, um caminho longo demais para seguir. O grito vindo de dentro como algo libertador, a experiência de, sozinha, ser mãe. A ousadia de - em uma tarde extremamente quente - padecer em um apartamento solitário, de um condomínio sem vizinhos.

Intervalos cada vez menores, medos cada vez maiores. Ousadia de ser algo mais na solidão, na pequenez de um apartamento silencioso. O suor pingando na testa, a força chegando nos braços. A naturalidade do corpo em expulsar aquele estranho-novo corpo. Sem amparo, sem apoio, sem festa ou outros olhares. Apenas a solidão ocupando espaço e tempo, na solidão do mínimo apartamento. A música cada vez mais baixa no rádio. Quem canta, Cazuza ou Chico Buarque?

A tarde cada vez mais quente, suor cada vez mais úmido. A dor persistente e sem intervalos. Tudo fora do alcance das mãos, exceto a criança que está quase chegando. O chão e o suor são as únicas coisas úmidas. Os gritos de dor que ninguém escuta, não há pessoa que acuda. Quase sem forças. De tanto sentir a dor, já estava acostumando... A dor parecia ocupar mais espaço naquele apartamento, diminuindo a solidão da mulher sofrendo. A dor ocupando mais espaço, enchendo a sala, aproximando-se do telefone, afastando-se dele. A dor simples, correndo por todos os cantos desvendando todos os objetos. A dor cumprindo o seu papel em uma tarde em brasa.

De tanto sentir a dor e toda sua imensidão, transformou-se em delírio. Delírio quase grito, o fim quase no início. O suor de tão gelado transformou-se em fogo. A tarde deixando de ser quente, a dor deixando de doer, o delírio esquecendo de delirar. Apenas mais um grito profundo. Um sorriso.

5 de out. de 2013

Proximidade

Postado em: Amiga da Leitora.

Lápis desapontados, pintando as mesmas coisas pintadas há séculos atrás. O não pertencer ocupando espaço, solidão esvaziando o espaço vazio. E nesse calor infernal junto do frio glacial, ando tão irracional. Eu algum canto da cidade vive a outra metade da minha alma, dormindo para não ver o amanhã amanhecer. Escondendo as dores nas entranhas da alma, nas cicatrizes do corpo, no fechar e abrir das pálpebras. Meu amor copiando tantos outros. Eu simplesmente a repetir, nesse círculo vicioso, dessa vida viciada. Gritando meus medos aos surdos. Lágrimas rolando secas, tão secas quanto o asfalto ao meio-dia. Nós por todo o corpo. O corpo sentindo falta do outro, do ouro de outro corpo. O ouro que é a ação da gravidade entre dois corpos.

Afastam-se. Esgotam-se. Sonhar é carregar o mesmo peso de agir. Simples gotas d'água caindo no corpo morno, quente por causa do sol. O frio da alma permanece, como um aviso de destino, de morte. As mãos deslizando pelas curvas frias, úmidas de uma umidade quase inventada. Sem portas batendo, ou gritos longínquos. Apenas um verão infernal, invernal. A liberdade de quem desfaz-se das roupas em uma tarde de calor e, no simples ato da entrega ao nada, sentir esse nada tomando conta dos espaços existentes e inexistentes. Contemplando o mundo feito criança abismada, feito gente entusiasmada.

Algo transparente como água saindo das mãos, como um rio puro. Um rio de pureza do corpo experiente, do corpo... O controle descontrolado, as ordens, ordens, ordens. E de serem tão ordenadas, transformaram-se em ecos. Ordens, ordens. Feito oração para expulsar a maldade. Feito mantra para encontrar a alma no seu desencontro. Algo brotando feito árvore firme. Amor? Ah, andam todos tão cansados de amar que tenho medo. Aqui, amando minhas coisas e amando-as para que o mundo não as ferisse. O ato da perda, a falta da insignificância de outro corpo próximo, de outra troca por perto. Era como estar em algum lugar desconhecido, incapaz de mover-se. O sopro sessava em sua mente e sentia que apagaria em poucos segundos. Tudo estava acabado. Nada de socorro imediato.

Os gestos, ações. Cobranças de fidelidade, lealdade, simplicidade, ingenuidade. Como se resgata uma alma perdida? O rosto bem delineado, de linhas retas, formando um contorno perfeito. O olhar digno de anjo, tamanha era a sua incerteza. O corpo obedecendo, convertendo-se em máquina programada por algum fabricante desconhecido em países estranhos. Mãos menores, o corpo frágil, o juramento da eterna proximidade. Vontade de ser...

Tudo escapando das mãos ao menor sopro. Sopro para que tudo se afastasse, o lugar deveria ser do próximo merecedor de tamanha liberdade falsa. A suada despedida entre alguns, entre outros e todos. Possibilidade de incompatibilidade. Falta de exatidão.

4 de out. de 2013

Metamorfose

Tudo mudando, o medo permanecendo
O amor buscando, visualizando...
A vida acordando e 
Adormecendo
Sorrindo, fingindo.

Vontade chegando e passando
Acabando
Eternizando
Finalizando
Expressando.

Essa vontade de sair vomitando
O que está matando
O que está maltratando
O que está humilhando.

Vivendo.

29 de set. de 2013

Verbo

Queria o simples encontro de nossos olhos. Saber o que a alma sente ao encontrar outra exatamente igual. Mesmas dúvidas, mesmos traumas. A palavra, que nos aproximou, não sabe o que dizer. Meu amor escreve sem saber o que escrever, meu amor não faz amor, meu amor sabe temer. Meu amor é um sentimento confuso, falso, meu amor é uma paixão. Queria ouvir a voz do meu amor, entender cada fonema saindo dos lábios. Sentir o juntar dos pulsos, esquecendo as mãos. Um amanhecer idealizado intimamente, algo inconsciente. A dor no peito que desce para os braços. A dormência de estar tão longe, sussurrando poemas, sussurrando como se meu amor pudesse ouvir. Dormindo sem rezar, apenas idealizando o amor que um dia será realizado. Idealizando o amor de milênios passados, lembrando o primeiro encontro dos olhos, a primeira mensagem trocada. O primeiro poema, o desejo de sucesso. Palavras iniciais, erradas, triviais.

A inocência do passado, fazendo encontros distantes; a inocência de lembrar como era o corpo do meu amor, em reformas exteriores. As mesmas paredes nos rodeando em épocas diferentes, nossas energias encontram-se na biblioteca. Amor, palavra do dicionário, verbo da gramática. Sentimento.

O desejo do encontro. Desespero por não saber o timbre da voz, quais os gestos distantes, o olhar. Um amor de outros tempos, porém, um amor novo. Quebrando barreiras, exceto a barreira do conhecer. O sonho de encontrar o amor em uma esquina qualquer, dessa vez, sem textos ou dedicatórias. Apenas rosas nas mãos, suor frio e um sorriso tímido-torto. Andar em uma avenida, quem sabe? Aspirando o ar imundo sem contaminar o nosso sentimento.

E esse amor é algo tão cheio de focos e facas. Será essa a minha imperfeição, dizer que amo sem saber amar? São tantas palavras que não escrevo, que só imagino. E fica aquele "não-esquece-que-eu-te-amo" no ar.

27 de set. de 2013

Sete da manhã

"Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Pra essa gente careta e covarde
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Lhes dê grandeza e um pouco de coragem."

Cores, pessoas e uma escada solitária. O livro que não voltou para as minhas mãos. Meus passos apressados no início da manhã, milhares de palavras ecoando, passos automáticos, palavras e palavras. Pés que pisam a areia, as pedras úmidas, o asfalto morno; pés que vivem todas as manhãs. A beleza escancarada e tímida, a beleza... O ar puro de minutos atrás transformado em algo cinza, visto a olho nu. A alma jovem, despreparada, madura e atormentada. O medo das pessoas, o carinho com as mesmas pessoas. Olhares mortos de início de manhã. Algo nascendo no âmago, no ventre, no coração. O mundo crescendo nas minhas entranhas em cada manhã.

A vida iniciada com gosto de quem morre. Antigos quinze anos, não são nada os meus quinze anos... Quinze anos, é tudo o que possuo. E as paredes me cercando outra vez. Quinze segundos de liberdade em cada manhã. Mais sorrisos e rostos preocupados. Cada dia parece ser o pior, o último. Cada dia é o primeiro, o único. As mesmas paredes de sempre, o mesmo chão, pessoas diferentes de mesma expressão. Olhares e pensamentos, são as únicas coisas que os distinguem. O mundo que mora em cada grão de areia. Olhares que prendem outros, faces que nada expressam. Sorrisos ainda são raros, tímidos. 

E dentro de outras quatro paredes, algumas mentes vazias declamam seus pensamentos vazios e desconexos. Vomitam preconceito em nome de Deus, é a mesma Inquisição de séculos passados. São os mesmos pecadores apontando pecados alheios, pecados que não são pecados. Os torturadores do século XXI, usam como armas os fonemas, em nome de Deus.

24 de set. de 2013

Infinitos

para M. M.

Era como observar o sol através de uma pequena fresta. Conseguia vê-lo, senti-lo. Mas era algo distante, dolorido. Uma antiga ferida recentemente aberta. Os olhos fitando, vivendo. As mãos suando, tremendo. A impossibilidade. Impossível viver sem virar essa página, atravessar tal ponte, escalar uma montanha. Traumas acumulados, vidas. Drásticas mudanças.

Os olhos, as mãos, os sorrisos, os ares. O que te cerca é o mesmo que nos cerca? Flores, folhas secas. Páginas viradas, páginas marcadas. Suspiros doloridos, o leve fechar dos olhos, o milimétrico fechar das mãos. A vida brotando perto, o amor brotando longe. Tudo nascendo, até o inanimado. O sorriso brotando tímido, o coração acelerado, batendo feito animal medroso.

O caminho tornando-se curva. O caminho curvando-se para o mundo. Alguém dobrando a esquina fez dela caminho. Do ato de caminhar, fez fuga. Da fuga: alegria, vida. Da caminhada, corrida. Corrida rápida, leve, libertadora. Corrida-quase-voo. Sussurro quase beijo. As palavras presas no peito acelerado. Palavras presas no coração de quem demasiadamente ama, demasiadamente chama, clama.

A rosa nas mãos, ou uma flor. Exatamente como os que amavam há trinta anos atrás. O medo, as mãos, o suor, gelo, olhos brilhando. O caminho caminhado, os traumas superados, os sentimentos confessados. Páginas rasgadas, viradas, esquecidas, escritas. A vida sorrindo longe para o amor chegando perto.

18 de set. de 2013

As moças

Originalmente postado em: Amiga da Leitora

Our steps will always rhyme,
You know my love goes with you

As your love stays with me,
It's just the way it changes
Like the shoreline and the sea.
[...]
Hey, that's no way to say goodbye.
- Leonard Cohen


Tudo no lugar, limpo, sem os grãos de poeira que ainda te viram aqui. Só o cheiro do seu perfume ainda está aqui, maldita a hora que quebrei a primeira coisa que tinha perto das mãos. Até as formigas parecem mais lentas depois que você se foi. Sexta-feira, meio-dia, você andando de uma ponta a outra do quarto, esfregando as mãos. Até que eu, preocupada, como quem não quer nada, acendo um cigarro, largo o livro e puxo conversa.

   - O que houve? Você está estranha, preocupada, quase sufocando... Quer conversar?

Silêncio. O gato quebra mais um prato na cozinha. Nenhuma voz. Duas moças caladas em um apartamento que as duas decoraram, há cinco anos atrás. Lísia ainda fumava, pés descalços, soltando fumaça pela boca como alguém superior, alguém que quer respostas. Luísa estava parada, olhando Lísia fumar, vendo o corpo delineado da moça suando de tanta expectativa. Lísia era a mesma, atrás dos óculos vermelhos, do sorriso que não mostra os dentes, do livro nas mãos, do riso musical e escandaloso; tímida, com cara de misteriosa, algo que realmente era, já que ela parecia ser um mistério indecifrável. Luísa era mais baixa, com um corpo de brasileira, como dizem por aí; sorria sem medo, odiava cigarros, mas adora ver sua moça fumando na janela, provocando-a com a maior naturalidade do mundo. Nomes quase iguais, idades iguais e signos que não possuíam compatibilidade.

   - Luísa, fale. Você está assim há um bom tempo. Eu posso te ajudar, você sabe disso.
   - Como, se você é o problema?
   - Foi algo que eu fiz? Algum rapaz que fiquei? Você sabe que aquele rapaz não significa mais que você, nunca estive apaixonada por ele!
   - Seus ficantes nunca me incomodaram, você sabe. Você sempre foi livre para amar quem quisesse e até acho isso bonito. Te conheci assim, te quis assim. Só que eu não aguento mais te olhar e te esconder a verdade, te vejo tão inocente, com um short destruído da época da sua adolescência, com esse olhar puro de quem sabe tudo, com esses cachos presos, com livros nas mãos... Acabou-se o amor que eu tinha por ti. Não sei explicar! Há tempos eu finjo que ainda te gosto, mas só te vejo como um enigma bonito de se ver. Você é admirável, mas eu não te admiro mais. Morreu algo que eu queria eternizar.
   - Eu nunca dei sorte para o amor. Não sei qual milagre te trouxe para os meus braços... Duramos muito, até. Não é?

E não era. Lísia chorava um pranto infantil, apagou o cigarro com os dedos. O fogo queimou os dedos da mão esquerda, mas não doía. De repente, começou a prender os gritos que vinham junto com as lágrimas, o choro não era mais infantil. Com ódio nos olhos, fitou Luísa como se fosse matá-la, quebrou um vidro de perfume na parede e disse o maior número de palavrões que conseguiu. Era uma dor nova, sufocava. Era pior que respirar pela primeira vez ao nascer. Mas decidiu parar de chorar, passaram-se horas. Lísia caída, tentando juntar seus pedaços. Luísa calada, de pé, esperando aquela moça falar alguma coisa. O choro de Lísia cessava, ela saiu da cadeira, vestiu uma blusa e colocou o celular no bolso.

   - Vá, Luísa. Você é tão livre quanto eu, quanto qualquer pessoa. Ainda te amo, vai demorar um tempo para acostumar com a ideia de estar sozinha aqui. Eu que sempre adivinhei tudo, que sempre li as entrelinhas dos teus gestos, eu que... Eu não desconfiei do amor morto que você carregava na alma, carregava-o como a mãe carrega o filho morto no ventre, esperando que ele renasça. Vá, mas por favor, volte logo se descobrir que foi engano. E não me procures mais se o fim foi verdadeiro. Ligue quando já estiver um pouco longe daqui, só voltarei quando não estiveres mais. Não quero assistir a última cena da peça que escrevemos. Foi maravilho enquanto existiu amor.

Luísa permaneceu calada, apenas confirmou com a cabeça tudo o que Lísia dizia. Era dolorido ver aquela menina pela última vez, naquela situação, chorando por todas as dores do mundo. Era só mais um amor que chagava ao fim e isso era normal demais. Lísia que sempre foi exagerada em tudo... Em breve, outra moça estaria ali, ocupando os mesmos cômodos, ou um rapaz. Ou ninguém. 

O celular de Lísia não tocou naquela tarde, nem no dia seguinte. Só na noite de domingo Lísia teve coragem de voltar. E sim, ela havia ido embora. Metade do guarda-roupa estava vazio, faltavam livros na estante, o vidro de perfume continuava estilhaçado no chão. Nada de cartas ou bilhetes, apenas a partida fria de quem já amou demais.

15 de set. de 2013

Sussuros

Desapego, costas viradas.
Olhos desarmados.
Sonhos perdidos.
Amor destruído.
Vidas, vividas, marcadas.
"Acho que a gente é que é feliz."
Cantamos, achando as palavras erradas.
Marcas destroçadas.
Pedras no caminho.
Sozinha sem destino.
Nesta selva camuflada.
Você é meu desalinho.
Amor repentino.
Alma desarrumada.
O valor do meu sorriso.
Meu tudo, meu nada.
Teu amor, meu paraíso.
O sabor de minha lágrima.
Minha voz imperfeita, desafinada.
Nos teus ouvidos busca abrigo.
Minha sina de falsa apaixonada.

Milena Moreira e Gleanne Rodrigues.

Francisco

Caiu enquanto dava o seu passo, o último. Passo que levava a crer que aquilo era dança. E o susto repentino congelava as veias, o dono do bar chamou o teu nome. Você, assim imóvel, parecia estátua. Com o vento fazendo ondas na tua roupa. O que será da tua vida se ela virar morte? E eu, meio quieta, observava tudo. Na porta do bar, caíras mudo; a bicicleta ao lado gritava: "Futuro!"

E, meio desesperado o dono do bar ficou. Os amigos na esquina ele também chamou. Ao homem da ambulância, disseram: "Venha logo! O homem está caído, quase morto. Ao seu lado uma bicicleta velha clama por socorro, e no seu bolso está um litro de bebida alcoólica."

E ao tocarem teu pulso, não sentiram nada. Quem estará aqui para chorar a tua morte? Do sol tiraram o teu corpo calmo, à sombra de uma marquise ficou calado. Tua cabeça pendia como se estivesse morta, tuas mãos já não tinham nenhuma força. E eu, assim, com as mãos quase postas em oração, pedi que algum santo te salvasse daquilo. Depois pensei no mundo, e que ele nem valia a pena. Desci os degraus com passos frouxos; pensei se existiria mesmo o Paraíso, queria saber onde realmente tua alma estava.

Chegaram ambulâncias depois de longo tempo. Vermelhas e brancas, gritando desatentas. E deram vários choques no teu peito frio, massagearam teu coração como se ele fosse frágil. Prepararam a maca com tanta pressa, mas uma pressa profissional. Chegaram depois tua ex-mulher e um filho, filho que derramou imperceptíveis lágrimas. Depois do meio-dia te declararam morto. Com isso, todo o teu público foi embora, eu fiquei tão pensativa. Quem será que sentirá a tua falta? Os homens riam diante do espetáculo, depois esqueceram o fato mágico.

Francisco, descanse em paz.

P.S.: Baseado em um fato real.

12 de set. de 2013

9 de set. de 2013

Siddhartha

P.S.: Texto originalmente publicado no blog Amiga da Leitora.

Sábia mente vazia. Todo conhecimento ao chão, espalhado, destroçado. A alma na estrada, em algum carro antigo; carro comprado pelo menor preço possível, alma liberta pela falta de preço. Cabelos curtos, a falta do dinheiro causando uma magreza frágil, Joni Mitchell no rádio do carro. Uma carteira de cigarro no banco do passageiro. Cigarros só são bonitos se você não acendê-los, por isso, sempre andei com cigarros e sem isqueiros ou fósforos. Estou vivendo a vida que meus ídolos admirariam. Ídolos que morreram por amarem demais o mundo e odiarem eles mesmos. Ídolos, meus ídolos... Pés de barro, pés como os meus. Sem diplomas, sem emprego definido. Quase cheguei ao ponto de vender os únicos trapos que vestia, trapos que nada valiam. Escrevendo contos, dormindo na casa de desconhecidos ou ao relento. Meus pais em uma cidade distante, do outro lado de um oceano sem nome. Meus pais... Será que sentem saudade da ovelha negra da família católica e conservadora? Saí de casa quando completei dezoito anos de idade, depois de deixar toda a minha família escandalizada. Descobriram que eu morava e namorava com dois rapazes. Foi um caos, o caos. De nada adiantou explicar os conceitos do poliamor. Na língua deles, aquilo não passava de falta de vergonha na cara. Eu, extremamente feminista, fazia o que bem entendia, amava quem eu queria, jamais aceitei casar na igreja. Meus pais me amavam e odiavam na mesma medida. Nunca pude mudar o meu eu. Era ser o que minha alma gritava ou matar-me.

Eu, tão sensível e tão incompreendida. Uma faculdade quase terminada, faltando três meses para receber o diploma, tranquei o curso de Jornalismo. Até a escolha dessa profissão enojava meus pais. Eu poderia ser professora, médica, qualquer coisa... menos feliz. Escolhi a liberdade e a solidão. O amor seria para sempre a minha necessidade secundária. Conheci cachoeiras, mares, cavernas e solidões. Conheci rapazes certinhos, idiotas, marombados e hippies. Só os hippies me ensinaram a ser feliz. O primeiro hippie que conheci se chamava Diego. Tinha dezoito anos quando o conheci, ele havia nascido no mesmo dia que eu, na mesma hora, mesma cidade e na mesma maternidade. Ele dizia que éramos cópias, os seres perfeitos que por acaso encontraram-se. Com ele fugi de casa, fugi do país, aprendi meia dúzia de idiomas, fugi de continente, aprendi yoga, magia e meditação; com ele tive meu primeiro filho que morreu antes de completar os nove meses da gestação. Era um menino, chamava-se Siddhartha; nós o enterramos e um lugar desabitado e no túmulo dele plantamos uma árvore. Nosso menino ganharia a vida que perdeu.

Hoje, dez anos depois, estou no lugar onde enterrei meu filho. A árvore é frondosa e inexplicavelmente bela. Siddhartha... Ao enterramos nosso filho, decidimos que era a hora de uma separação. Eu fui para o México, ele foi para algum lugar da América Central. Hoje voltei para o Brasil, a terra que me deu vida. Embaixo das folhas de meu filho fiquei. Permaneci esperando Diego. Doze meses se passaram desde que cheguei, só depois de doze meses Diego chegou. Acabou preso ao ser encontrado sem documentos, mas ali estava ele. Com algumas rugas, rugas adquiridas por sorrir demais. Os longos cabelos estavam menores, os olhos tinham a mesma alegria. Abraçou Siddhartha sem acreditar na mudança dele. Não era uma árvore, era nosso filho. Juntos, passamos quinze dias com nosso filho. Meditamos, comemos os frutos que nosso filho nos dava, rezamos, sorrimos, choramos... Nosso amor ainda estava vivo, assim como nosso filho. Mas, seres que foram destinados a amarem-se para sempre jamais permanecem juntos. Diego beijou meu rosto, eu beijei as mãos dele. Em uníssono nos despedimos.

Mais uma vez saí sem destino. Um pouco angustiada, mas sorrindo. Do outro lado do mundo existia um homem que me amava, um filho que estava preso ao chão com suas raízes. Tudo era perfeitamente estranho. Pela primeira vez acendi um cigarro.

8 de set. de 2013

Resiliência

E acontecem essas coisas que não conseguimos explicar para as crianças. Nascemos, juntamente com os pingos de chuva, os raios de sol. O mundo dói, você não sabia? É mais uma das infinitas coisas que não nos ensinaram na infância. Crescemos como flores selvagens, mesmo que nos protejam excessivamente. Acho tão injusto o julgamento de um passado tão distante. Será que você também pensa assim? O poeta disse que é preciso virar a página e eu acreditei, concordei. Você me indagou sobre as marcas. E eu disse que elas são necessárias e só. Nunca me senti tão rasa. Agora quero que você aceite sua profundidade.

Eu que leio as entrelinhas, quis ser Deus. Dessa vez por uma causa nobre. Eu que de Deus já duvidei, eu que de Deus desacreditei. Quis ser o mais perfeito dos seres para te explicar o que eu, humana, não consigo dizer. O mundo é bom, menina. Mas a maldade quer que vejamos as coisas de outro ângulo. Dizem que eu tenho todas as palavras na palma da mão, mas isso é um inocente engano. Eu queria, sim, ter todas as palavras. Só com essas palavras que eu não conheço, eu poderia tirar um pouco da tua dor. Mas se, por um acaso, o mundo te machucar outra vez, eu prometo que meu silêncio estará sempre contigo. E as pessoas que possuem o meu silêncio cheio de palavras que não consigo dizer, bem, são elas que eu mais admiro. Admiro, mesmo que não consiga expressar.

E agora, moça?
O mundo quer acabar
Mas ele sempre recomeça.
E nós, vãs criaturas, não podemos recomeçar?
De cada cicatriz
Devemos nos orgulhar
E de nada nos valerá a escalada
Que não consiga nos marcar.

Para uma moça que nasceu há exatos dezenove anos. Mais uma vez, feliz aniversário.

26 de ago. de 2013

Primitivos

Era tarde da noite, noite da tarde. Praça escura, vento frio, ruas desertas. Sombria, corria, fugia, gemia. Possíveis estupradores andam de lá para cá. Almas solitárias caminham, olham, espiam e vão. Guardas estaduais me olham e caminham. Os tijolos falam, o asfalto fala. Minha alma voa, meu corpo pesa. Buscando o vazio de Sidarta? Distanciando-me do meu eu? Ah, gota d'água no mar. Saindo da redação depois da meia-noite e sempre a mesma praça. O mesmo medo, mesmo verde, mesma escuridão. A mesma falta de amor. O corpo intocado. Falta de esperança. Apenas o corpo supostamente sábio e a solidão. Caminhando pelas ruas, o medo torna-se obstáculo secundário. O passado é a única coisa que realmente existe. O futuro é sempre um obstáculo, estou sempre alcançando o futuro. O medo permanece.

Noites passadas, corpos quentes na ponta da cama. Da imensidão da cama de solteiro, menos da metade dela lhes bastava. O rádio reproduzindo uma música séria demais para um momento que só envolve instinto. Só instinto. Os dois juravam ser o "tudo" um do outro. Os dois sabiam que as palavras eram puras mentiras, mentiras doces de dois animais. Ah, o desamor.

E depois do trabalho, quem era ela? A solitária, que precisava sempre ter um amor que nunca tinha? O amor era necessidade secundária, pelo menos era o que ela obrigava-se a acreditar. A fumaça do cigarro se desfazendo, os passos leves e firmes. A esperança de encontrá-lo atrás de um poste, numa rua escura. Encontrá-lo em alguma calçada, entregue, beijando um cara enigmático. Encontrá-lo em uma esquina, disputado por meia dúzia de homens e mulheres.

Noites passadas... Há quinze, vinte ou trinta dias atrás? Parecia tão dolorido e cansado... Efeitos do álcool, drogas? Era tudo o que me enojava e me atraía. Era tarde e estava voltando para casa. Roubei o cigarro de sua mão enquanto ele fumava na esquina, totalmente alheio ao mundo. Um completo desconhecido e eu, uma completa maluca. Seguiu-me e, pela primeira vez, não temi um desconhecido; alcançou-me em poucos segundos. Perguntou meu nome. Respondi. Perguntei seu nome, ele disse: "Batiza-me!" Chamei-o de Narciso. Deixei que ele me levasse. Apartamento de dois cômodos na pior área da cidade, incrivelmente, era cheio de livros e pinturas. Cheio de bebidas e cigarros. Deu-me apenas um gole de vinho na mesma taça que ele bebia, a única taça que possuía. Eu, moça bem vestida, acostumada ao conforto que meu salário médio me proporcionava. Eu, ali, na pior parte da cidade, com um desconhecido.

Não fomos além do que poderíamos. Não fizemos mais do que os nossos instintos de animais puderam. Pura primitividade. Apenas instinto, primitividade, irracionalidade, barulho, atração, entrega, sorrisos de quem não é feliz. Necessidade de ser de alguém que não é. Dias depois, só a praça me restava.

22 de ago. de 2013

Um verde desejo de ser fruto

Como amadurecer? Apenas ser fruto verde, parado, nascido na árvore sem saber? Seria bom apenas parar e deixar o tempo ser. Eu deixaria de ser verde sem nada fazer. Assim como os frutos, nasci sem nada saber. Como posso crescer se o tempo nada faz por mim? Apenas ser: verde, parada, sentindo a força do vento.

Como vou convencer o tempo a ir mais devagar? Como posso explicar que sou humana? Como terei calma para dizer que não sou fruto nascido em árvore, que não sou escultura feita no mármore?

E durante o banho encosto-me na parede fria; parede branca e limpa assim como Deus. Fico procurando raízes que me transformem em árvore. Por quê? Deus, por que não me fizeste  forte, firme e eterna? Tenho olhos da cor da terra, dedos que desejam encontrar o solo e ali germinar. Sou o projeto inacabado, que mudou seu rumo por si só. Agora arrependo-me. Não consigo crescer com esperança. Eu sei que hoje poderia ser fruto verde na copa de uma árvore, apenas deixando-me ser. Não sei o que fazer da minha vida humana. Peço que acabe logo o meu castigo e deixe-me voltar.

E no fim de tarde, corri pelo campo mais verde e desabitado.

17 de ago. de 2013

Maritimidade

À noite, vomito sozinha. Vivo da ditadura que me oprime em silêncio. Tenho o necessário e não sou feliz. Às vezes, me falta algo que eu não sei o nome. Às vezes, minha vontade do mundo some. Quase sempre, penso: o que será de mim, da minha vida? Não percebo que sou tão jovem, que posso entregar alguns dias da minha juventude ao ócio. Percebo, mas temo. Amor romântico virou prioridade secundária, assim será até transformar-se em necessidade primária. Os livros não possuem respostas, eu não possuo perguntas. Estou a três graus da Linha do Equador, zona tórrida, o suor das peles que não se tocam, os corpos que não conhecem outros corpos. Geração perdida do século XIX, geração perdida do século XXI, mundo perdido desde o Big Bang. A explosão, a tragédia. A evolução, os animais, os humanos. Os homens-animais, animais-homens. Só existe massa de ar fria; umidade relativa do ar. Mais alta a altitude, pior ficará a respiração do humano estrangeiro. Se eu quiser morrer, tenho de subir até não aguentar. Estanho. Boro. Alumínio.

À noite, vomito sozinha. Ah, eu ainda morrerei. As correntes me prendem, me impedem. Meu corpo que nunca clamou por liberdade, agora me implora para ser livre. A Corte chega no Brasil, encena direitinho o seu teatro. O povo aplaude a peça. Eu quero ser a alma dispersa, um cromossomo que falta sem indicar síndrome. Um corpo sem controle, que o patriarcado não o controle. Para que eu viva, não apenas sobreviva. Para que eu faça caos à minha maneira, por noites inteiras.

16 de ago. de 2013

Um passeio pelo azul

Ouvir teus tons de azul.
O pandeiro do menino loiro indeciso.
Azul.
Um doce azul que não pacifica almas.
Só me lembra um corpo magro em uma cama.
O azul e seu fim.
Decifrando a tua alma, espírito.
E o doce azul dos teus olhos tão castanhos.
E os vitrais querem dizer algo.
E a tua voz, há tempos calada, quer falar.
Tuas cinzas azuis uniram-se à terra e renasceram desde então.
Um azul mais claro que o da nossa bandeira.
O azul das marcas roxas nos teus braços.
Meu doce rapaz de alma azul.
Tão atormentado, por quê?
Azul voando pelo céu, azul voando pelo chão.
Um tom de azul tão triste e dolorido.
Não seja azul, meu amor.
Não deixe minha alma menor.

P.S.: Mais palavras inspiradas pelo Renato Russo.
Dessa vez inspirei-me nos últimos dias de vida dele.
O azul é o azul do disco A Tempestade.
O menino loiro é o Marcelo Bonfá.

Da arte de admirar os semelhantes

(Ah, Clarice!)

Por que será que desde criança me identifiquei com os escritores? Certamente, imaginava que seria uma. Vejo neles uma beleza inexplicável, que vai além da simples beleza física. O olhar que penetra na alma, o cigarro nas mãos. Um escritor fumando é sempre diferente. Parece necessitar daquele vício, para libertar a alma no soprar da fumaça. As almas sensíveis são diferentes em quase tudo que fazem. A dor sem explicação, vidas difíceis. A necessidade do caos, o pensamento livre, a alma traumatizada, a sensibilidade extrema. Além de admirar-lhes os escritos, o corpo é igualmente admirável. Além do corpo, os gestos. É algo quase inexplicável, mas eu sinto. E sem querer, segundo os outros, estou me transformando em um enigma. Passando por uma metamorfose e transformando-me em uma escritora.

15 de ago. de 2013

Sobre as mudanças

(Me libertei daquela vida vulgar...)

Chegou a hora de mais um desabafo. Posso estar enchendo vocês com tanta bobeira mas, consideremos: estou em uma fase difícil. Mesmo que minha vida possa ser considerada fácil, se eu for comparar. Vamos ao que interessa.

Escrever é o alicerce da minha vida. Logo, minha profissão deveria ser escolhida baseada na escrita. E foi. Escolhi Jornalismo, profissão que considero apaixonante. Li alguns livros sobre, a teoria é muito bonita. Saindo do mundo dos livros, mergulhei para a realidade. O que vi? Bem, não foi muito animador. O que vi e vejo é um Jornalismo comprado.

Escolhi essa profissão para mudar algo do mundo, abrir os olhos das pessoas. Falar somente a verdade e nada omitir dos fatos. Mas estou vendo o Jornalismo seguir algo oposto desse compromisso com a verdade. Está tudo tão sensacionalista. Eu sei que a profissão não se resume ao Jornal que passa no fim de tarde. Mas "uma só laranja estraga a duzia inteira." já dizia a professora do fundamental. Mortes são "abafadas" na base do suborno, já que aconteceu em colégio nobre. O assalto foi universidade dos riquinhos? Ah, então é só pagar um suborno para imprensa que nada será publicado. Não importa se há dinheiro de sobra para manter a segurança de um campus e mesmo assim a segurança não é prioridade. O que importa é que vamos receber um salário extra nesse mês e a sociedade não precisa saber do que aconteceu. Esses fatos e outros tantos que não irei citar, me desgostaram. Me esgotaram. Percebi que eu chegaria aos meus dez anos de profissão sentido-me uma péssima pessoa. Sentada em uma mesa, me perguntando onde estaria a adolescente que eu era, me perguntado como me deixei influenciar pelo dinheiro.

Eu disse não. Não vou mais nessa. Esquece. Bye. Se eu fosse tentar mudar alguma coisa, seria como uma gota de água no mar. A vida é curta demais para exercer uma profissão que não se gosta mais. 

E o que diabos você vai fazer da vida, Gleanne? Cursar Letras! Sempre tive um pé em Letras, juntamente com o outro pé em Jornalismo. Para quem não sabe, além de escrever, eu leio MUITO. Amo Literatura e a Língua Portuguesa e tudo mais. Não vai ser difícil estudar o que eu já faço por prazer. Acho que a escolha foi até mais sábia. Salve Machado de Assis.

Esse texto não mudou a sua vida, mas mudou a minha.

12 de ago. de 2013

É inúltil


(Eu e Tufão - que faz tanta bagunça como um tufão de verdade. Andei me perguntando se gatos foram escritores em outras vidas, nunca vi companhia mais perfeita.)

Conversar com gente desconhecida, falar das amenidades da minha vida. Jogar conversa fora, ser adolescente sem destino e sem rumo. O vestibular ocupando a mente inteira, já não sei se os sonhos que tenho me pertencem. Farei uma prova sem me importar, acho que preciso sabotar uma derrota para saber lutar. Sou cem por cento poesia, cem por cento opinião, nos outros cem por cento você pode opinar. Sou um livro aberto de páginas arrancadas, não mantenho meus diários, mas gosto de cumprir minhas palavras. Me apaixono facilmente, acho que todo mundo já sabe. Mas eu grito, encolhida no meu silêncio; ali mesmo, no banco da escola. Com uma aura que já deixa meus ombros cansados, com cobranças surgindo de todos os ângulos desses trezentos e sessenta graus. O cometa que passa, o cara que me olha pelo retrovisor. Ninguém sabe o que eu carrego por dentro, só quem me lê. O tempo passa, passa, eu não faço nada. Hoje eu não sou ninguém, amanhã eu não sei o que serei. Eu explodo, eu corro, esbarro na parede e me machuco sem sangrar. Apenas reajo polidamente com o que me acontece, exatamente como a ferida que não sangra, a hemorragia que é interna. É uma fase difícil, este é um ano completamente maluco. Juro que nunca mais abrirei minha boca - ou meus dedos, se eu estiver escrevendo - para dizer que tal ano será pior que o anterior. Pus praga, pegou. Só tenho quinze anos, mas sofro por vidas inteiras. É só uma fase, sei que passa. A única vantagem é que não me apaixono pra valer desde maio, ou abril...

10 de ago. de 2013

Dia (im)perfeito

Citando R.R.: "Quase morri a menos de trinta e duas horas atrás." Se foi de acidente, homicídio ou suicídio? Bem, vocês decidem. Acreditem ou não, quase fui tomar um chá com Thanatos. As características do Ultrarromantismo correm nas minhas veias, apenas isso. Estou escrevendo porcaria, eu sei. É que eu não tenho o que contar. Ou tenho. Estou ressuscitando meu antigo amor por Drummond e lendo Machado de Assis. Não estou sacando nada de Física e odiando Química. Eu tento, juro. Mas certas coisas não foram feitas para mim. Me chamam de nerd. Mas não sou, nem faço questão de ser. Para a inteligência que dizem que tenho, dou outro nome: sensibilidade. Mesmo que no resultado do tal teste de QI esteja escrito algum número que esqueci e um "superdotada" como complemento. Isso me dá náuseas. Ah, antes que eu esqueça! Primeiramente: palmas! 


Palmas batidas, então, lá vamos nós. Estou escrevendo contos em uma agenda velha (novidade? não!); a diferença é que esses contos estarão nas páginas de um livro que eu imprimirei na gráfica da esquina. Só estou fazendo isso por causa do Álvares de Azevedo, que já tinha escrito centenas e centenas de páginas antes de seus vinte e um anos. Com um livro escrito eu posso cair de um cavalo e morrer em paz. É praticamente um seguro de vida. Então, alguém achará minhas genialidades - que não possuem genialidade alguma - que serão publicadas em dezenas de edições nos próximos séculos, que serão estudadas por jovens do Ensino Médio. Eu sou pessimista assim mesmo, por isso que não me aguento. Enfim, nem quero morrer aos vinte e um. Antes, prefiro deixar na Terra alguém que tenha minhas características genéticas no seu DNA. Mas, como dito anteriormente, o livro é para garantir. Pensei em acabar com o blog, em parar de escrever - sim, pela milésima vez - mas cá estou eu, voltando às terras tupiniquins, mesmo que esteja falando bobeira. Perdoem as palavras inúteis, mas quem escreve também é gente.

4 de ago. de 2013

Viver morrendo


Dias desses me peguei na janela, pensando. Todo mundo, ou quase, faz aquilo que ama. E eu, vivo, folha seca pelo mundo. E eu, vivo, folha verde pelos cantos. Só estudo e, às vezes fico de mente e ombros pesados. Tento ser inteligente, muitos dizem que consigo. Tento ser diferente, isso consigo, sendo anormal. E eu, vivo, lendo poesia e livros que encontrei em promoção; lendo pdf que baixei, coisas bobas que escrevi. Vivo com um ar indeciso, com um medo tão grande de algo que não sei onde está. Acho que ainda tenho medo dos monstros que aparecem quando meu quarto está escuro. Nesse escuro, obscuro. Acho que não tenho caminho, acho que já tracei minha vida e sei exatamente para onde vou. São estranhos os meus pensamentos e estranhas as minhas necessidades. Me apaixono fácil, às vezes, até por um par de olhos que nunca mais verei. Me apaixono todos os dias por um homem diferente e, até agora, não amei nenhum. Amar é essa coisa que vem da alma, não é fácil para ninguém, imagine para mim. Quando eu amar, será por inteiro. Não sei se amarei nesta vida ou só em outra. Ah, quando eu amar. Espero passar por essa vida e dizer que amei, nem que seja apenas por vinte e quatro horas. Planejo tudo, nada sai como o planejado. Saio do ponto inicial e corro por todo o percurso. Parece que sei exatamente para onde vou, só que insisto em ter medo. É cedo demais para saber de tudo. Todo mundo, ou quase, faz aquilo que ama. Inconscientemente, eu já faço. Eu escrevo, isso basta.

28 de jul. de 2013

Caminhos


Eu leio com a inocente esperança. A esperança de ser algo mais. Das escrituras sagradas às coisas que chamam de obscenidades mundanas. Eu leio com esperança. Me sinto como a Papisa que a Igreja tentou apagar, me sinto como a Papisa observando a incoerência do altar sagrado. Altar construído com os roubos assassinos aos povos pagãos. Eu leio com esperança. Admiro as palavras dos homens e acho estranhas as palavras que dizem ser de Deus. Descrente? Jamais! Eu acho é que acredito em coisas demais. Pequenas interferências, incongruências. Ah, idolatria! Quanta imaturidade! Eu leio com esperança. Os homens de instintos animais, homens que matam em pleno cais. A Sagrada Bíblia, a Doutrina de Buda, O Livro dos Espíritos, Deus, a Deusa. O homem e suas dúvidas, seus desentendimentos. O Vaticano está sendo atacado por bombas.

27 de jul. de 2013

Raíza



"Algo de raiz, de profundidade até no nome. Olhos que falam uma língua antiga, língua que nenhum ser dos tempos atuais entenderia. Moça indecifrável, indecisa e perdida ao andar pelas ruas cheias, um rosto sério que parece sorrir quando o pensamento voa longe. Um quê de dor na expressão, um quê de amor na escuridão. Indecisa, corpo indeciso, alma flutuante. Ideias lindas, uma visão de mundo totalmente igualitária. Eu diria que você é um ser humano exemplar, mesmo que tenha toda essa tristeza na alma, mesmo que tenha os milhares de altos e baixos nessa vida complicada. Eu te entendo. Entendo teu pouco e enorme grande tempo de vida. Você é." 

Mesmo no meio de toda essa tristeza eu consegui sorrir com esse bilhetinho. Palavras dele, e ele mesmo colocava aspas. Ele que me conhecia tanto, que me amava tanto, ele que eu tanto amo. Amo, mas é dessa forma diferente que eu tenho de amar, de enxergar tudo. Alguns anos passaram, parece tanto tempo... Ele foi um refúgio, um pequeno lugar seguro no meio de todo esse caos. Ele foi o único que não me puxou para o fundo do poço, o único que se importava e que realmente me conhecia. Velhos tempos.

Forçada a mudar, forçada a assumir uma identidade que não me pertencia, forçada a ser uma alma habitando no corpo errado. Enfim, uma marionete em mãos erradas. Por fraqueza ou pura inocência, acabei aceitando, deixando-me levar. Um dia inteiro no consultório branco e disfarçadamente tranquilo, obrigada a contar tudo que eu não queria. Sentindo o gosto amargo de cada novo comprimido em fase experimental, lendo bulas e mais bulas, com medo dos efeitos colaterais. Diziam: "Tudo psicológico, excesso de psicologia. É fase e com o tempo passa." Tudo o que eles não sabiam é que eu me aceitava e me amava daquele jeito. A minha visão diferente do mundo, batizaram de depressão. É estranho de explicar, de certa forma é inexplicável. Mas aceitar o que se é, é perfeitamente normal. Aceitar e entender não são ações que a sociedade costuma ter.

Como um gay, uma lésbica, eu sofria e provava do gosto amargo do preconceito. Preconceito por carregar no meu peito uma dor triste, dor que eu aceito. O mesmo preconceito que a sociedade tem com os loucos. Tudo o que é diferente do dito "normal" é alvo do desprezo e da ignorância. Mais normal do que os padrões eram as minhas dores e meus pensamentos, que nasceram comigo e nunca foram padronizados por ninguém. E como uma pessoa diferente, eu era obrigada a me esconder com sorrisos falsos e falsas eram as minhas alegrias.

Ver tudo em preto e branco foi minha primeira escolha inconsciente. Às vezes eu via as coisas um pouco amareladas, como em um filtro do Photoshop. Mas isso também foi escolha minha. E, de repente, querendo deixar de lado minha pura inocência, fui descobrindo que meus valores não deveriam seguir os outros. Eu não deveria ser como um rio, indo sempre para a mesma direção. Nadar contra a correnteza foi minha escolha. Agora sei que tenho tudo em minhas mãos.

P.S.: Esses parágrafos são dedicados à Mi, que me deu a ideia de escrevê-los. E para todos os que sofrem ou já sofreram com a incompreensão alheia.

25 de jul. de 2013

Não vejo só poesia


Os cabelos que caem no ralo do banheiro são apenas pequenos sinais de morte. Outros fios virão e preencherão o espaço vazio. Os pingos que caem deveriam ser pequenos sinais de alegria para ti. A água que tira o teu cansaço deveria te fazer sorrir.

Que sabe, rezar no banheiro. Sentir a água caindo, gelada, te fazendo tremer. Meditar, agradecer. Agradecer por tudo o que você tem. Se arrepender, quem sabe? A água continua caindo e você deveria ser grato. Ainda há água no planeta, ainda há vida na nossa pequena Terra. A água cai no seu corpo transformado, corpo que já te fez chorar. Corpo magro adolescente, corpo um pouco modificado pela fase adulta, corpo totalmente transformado pela meia-idade. Nada com o que se preocupar, certo? As moças da televisão são apenas marionetes, escravas do tão conhecido padrão. Não há motivos para chorar, o tempo muda tudo o que atravessa o seu caminho. Isso deveria ser um sinal de gratidão.

Se arrepender, quem sabe? Melhor arrepender-se agora. Das mentiras, da brutalidade e falta de amor no coração. Você tinha dinheiro quando aquele senhor te implorou por alguma moeda. Você zombou dos dependentes químicos, disse que a culpa era unicamente deles. Mas você nunca passou fome, nunca foi espancado, nunca foi humilhado por ter nascido, jamais foi odiado pelos próprios pais, nunca precisou de um meio para escapar, jamais precisou ver luz em algum fim de túnel. Tudo está sob seus olhos, tudo está ao toque das tuas mãos.

A mulher que apanha, a criança que agoniza de fome, o homem que corta os pulsos. E você, um executivo bem sucedido, que nunca sentiu o estômago roncar sem ter alguns reais nos bolsos? E você, mulher de bancário rico, presa no próprio mundinho luxuoso? E você, rapaz mimado que chora por não ter o mais novo celular da Apple? E você, moça que quer estar dentro dos padrões da mídia, mesmo que perca a vida por causa disso? Você que não aceita as estrias, os seios pequenos, as coxas desproporcionais. Você que trata as mulheres como meros objetos, que usa a força para que a namorada faça o que você quer. Você que não pede o divórcio para o marido machista por causa da conta bancária dele.

Você que é gente comum e quer ser como os que aparecem na TV. Você que tem tudo oque precisa, mas quer o carro mais novo, a área mais nobre da cidade, o celular assinado pelo gênio da tecnologia, o computador mais fino do mercado. Vocês de olhos tapados e corações congelados: há uma família que é sua, mas você não os conhece, não sabe nem como é capaz de lembrar o nome deles. Há um céu estrelado, mas você não se dá o trabalho de olhar para cima. Há um pedinte solitário no chão que sempre te cumprimenta, mas você não pode perder o seu precioso tempo para respondê-lo.

Você, que é um dos "vocês" aqui citados: é hora de mudar!

Tudo o que você vê, bom o ruim, é o que você poderia ser.

21 de jul. de 2013

(des)amor

(Cena de Wuthering Heights <3)


P.S.: São cartas e bilhetes que eu acabei encontrando nesse domingo tedioso. Um amor que acabou não dando certo. Os sentimentos morrem e as palavras ficam. Lembrando: cartas de amor são ridículas.

***
E esse olhar que não me deixa? É, esses teus olhos caminham comigo, estão sempre na minha cola, me observando. Esses teus olhos me observam tanto que me envergonho. Teu cheiro também anda comigo enquanto eu caminho como um anjo livre pelas ruas. Sinto teu cheiro nos meus lençóis e me pergunto se estou enlouquecendo. Você jamais esteve entre meus lençóis, mas seu cheiro está aqui. E está em todo lugar.

Tua presença está sempre comigo. É como se você estivesse atrás de mim enquanto atravesso a rua, enquanto estou na fila do banco... Pena que as coisas não acontecem como nos meus sonhos. Eu espero que um dia aconteça. Queria que você me dissesse: "Você não me pega! só para me fazer correr feito louca no meio da rua e depois te alcançar, receber teu braço.  É, bem que nós poderíamos ser como crianças outra vez. Às vezes o amor sonha tanto que faz a alma ficar pura outra vez.

Sabe, no meio de toda essa incerteza ainda mora a minha esperança, que divide morada com meu amor. Confesso, eu tenho medo de que tudo isso não passe de um sonho bom, dolorido, mas bom. Dói muito pensar que um dia você irá se transformar em uma lembrança... Mas, fazer o quê? O amor tem dessas coisas.

***

Parece que foi hoje cedo que te vi com um livro nas mãos, totalmente concentrado. Coisa bonita de se ver. "O livro é o santo e a senha." E realmente é. Mas isso não aconteceu hoje cedo, aconteceu há dois meses atrás. Mas eu guardo tudo como se tivesse acontecido hoje de manhã, ou há alguns anos atrás.

Guardo as coisas pequenas, os detalhes. As coisas que ninguém lembraria. A primeira vez que te vi, a primeira vez que fomos apresentados. Disso você não lembra, rapaz. Na época eu amava outro, era outra. Tudo era diferente desse presente incerto.

Você foi entrando no meu pensamento, deixando marcas em todos os cantos. Depois apareceu na rua, na frente da minha casa, na cadeira da garagem, na calçada... Não posso olhar para estes lugares sem te enxergar. Se pelo menos eu te enxergasse apenas nos arredores da minha casa, mas eu também fiquei marcada com os teus abraços. Lembro de cada um deles, até contaria se não fossem tantos. Lembro dos sábados, domingos, sextas, segundas e terças. Lembro de todos os dias e de todas as palavras, de todos os gestos. Lembro de absolutamente tudo. Só quero saber se isso tudo continuará fazendo parte de um passado sem futuro.

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Juro que eu queria te escrever um poema bonito ou um parágrafo bem caprichado. Queria te trazer para perto de mim outra vez, qualquer dia desses. Só para o fim de tarde ficar um pouco mais diferente, para ficar com rosto de brisa quente e hálito fresco. Queria esquecer teu cheiro e apagar todas as fotos. Apagar o brilho dos meus olhos e todos os sonhos que nem existiram. Apagar para parar de doer, sabe? Mas não dá para esquecer. Eu não desapego fácil das pessoas.

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Essa é para você, que tem medo de tudo. Que tem medo dos anjos, do Diabo e de Deus. E o pior: tem medo de si mesmo. Sabe, eu queria que você adquirisse otimismo e confiança, nem que fosse na base da porrada. Mas não dá, que pena.

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Já passaram tantos dias desde o nosso último abraço. Acho que você me apertou demais, sabe? Agora fiquei sentindo falta do (pouco) carinho que você deixou. Vê se sai de dentro das músicas, de dentro do cheiro dos perfumes. Desaparece dos solos das guitarras. Teu perfume ainda está naquele meu blusão lilás que eu vesti um mês atrás.

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Você iria me comprar uma aliança. Agora eu que te pergunto: Para quê? Acho que não tenho vocação para amarras, minha única aliança é com a escrita. E mesmo assim, essa aliança é maior que meu dedo, vez ou outra cai. Você já foi tarde. Quanto tempo perdido. Repito minha pergunta: Para quê?

19 de jul. de 2013

Antidepressivo

Faço parte da geração que escreve coisas no computador. Me orgulhar? De quê? Por vezes depressiva, lendo livros depressivos para pensar na depressão. Que coisa mais estranha ter essa alma. Que coisa! (...)

Trilha sonora da madrugada: