27 de jul. de 2013

Raíza



"Algo de raiz, de profundidade até no nome. Olhos que falam uma língua antiga, língua que nenhum ser dos tempos atuais entenderia. Moça indecifrável, indecisa e perdida ao andar pelas ruas cheias, um rosto sério que parece sorrir quando o pensamento voa longe. Um quê de dor na expressão, um quê de amor na escuridão. Indecisa, corpo indeciso, alma flutuante. Ideias lindas, uma visão de mundo totalmente igualitária. Eu diria que você é um ser humano exemplar, mesmo que tenha toda essa tristeza na alma, mesmo que tenha os milhares de altos e baixos nessa vida complicada. Eu te entendo. Entendo teu pouco e enorme grande tempo de vida. Você é." 

Mesmo no meio de toda essa tristeza eu consegui sorrir com esse bilhetinho. Palavras dele, e ele mesmo colocava aspas. Ele que me conhecia tanto, que me amava tanto, ele que eu tanto amo. Amo, mas é dessa forma diferente que eu tenho de amar, de enxergar tudo. Alguns anos passaram, parece tanto tempo... Ele foi um refúgio, um pequeno lugar seguro no meio de todo esse caos. Ele foi o único que não me puxou para o fundo do poço, o único que se importava e que realmente me conhecia. Velhos tempos.

Forçada a mudar, forçada a assumir uma identidade que não me pertencia, forçada a ser uma alma habitando no corpo errado. Enfim, uma marionete em mãos erradas. Por fraqueza ou pura inocência, acabei aceitando, deixando-me levar. Um dia inteiro no consultório branco e disfarçadamente tranquilo, obrigada a contar tudo que eu não queria. Sentindo o gosto amargo de cada novo comprimido em fase experimental, lendo bulas e mais bulas, com medo dos efeitos colaterais. Diziam: "Tudo psicológico, excesso de psicologia. É fase e com o tempo passa." Tudo o que eles não sabiam é que eu me aceitava e me amava daquele jeito. A minha visão diferente do mundo, batizaram de depressão. É estranho de explicar, de certa forma é inexplicável. Mas aceitar o que se é, é perfeitamente normal. Aceitar e entender não são ações que a sociedade costuma ter.

Como um gay, uma lésbica, eu sofria e provava do gosto amargo do preconceito. Preconceito por carregar no meu peito uma dor triste, dor que eu aceito. O mesmo preconceito que a sociedade tem com os loucos. Tudo o que é diferente do dito "normal" é alvo do desprezo e da ignorância. Mais normal do que os padrões eram as minhas dores e meus pensamentos, que nasceram comigo e nunca foram padronizados por ninguém. E como uma pessoa diferente, eu era obrigada a me esconder com sorrisos falsos e falsas eram as minhas alegrias.

Ver tudo em preto e branco foi minha primeira escolha inconsciente. Às vezes eu via as coisas um pouco amareladas, como em um filtro do Photoshop. Mas isso também foi escolha minha. E, de repente, querendo deixar de lado minha pura inocência, fui descobrindo que meus valores não deveriam seguir os outros. Eu não deveria ser como um rio, indo sempre para a mesma direção. Nadar contra a correnteza foi minha escolha. Agora sei que tenho tudo em minhas mãos.

P.S.: Esses parágrafos são dedicados à Mi, que me deu a ideia de escrevê-los. E para todos os que sofrem ou já sofreram com a incompreensão alheia.

Um comentário:

  1. A loucura e a lucidez são, num tão gigantesco quanto desastroso equívoco humano, apenas uma questão de maioria e minoria.
    GK

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