1 de mar. de 2013

Fatos da madrugada #1

Meia-noite, lanchonete lotada, todas as mesas estão servidas. Eu sentado aqui, com as pernas esticadas, pensando... Pensando em como seria se eu estivesse em um beco esquisito, fumando um cigarro, bebendo cerveja, com uma jaqueta de filhinho de papai. Não, longe de mim... Não quero ser igual ao meu pai, um bêbado. Infelizmente é a realidade. Não tenho nem cinco minutos de descanso, tudo nas costas do novato que vai cedo pra casa. Um estranho no meio dos garçons que pegam geral, que aspiram mais fumaça de cigarro do que o próprio oxigênio, que escutam músicas ruins. Que são meus opostos. E não, os opostos não se atraem. Não vou com a cara deles, mesmo que minha mãe seja amiga do dono da lanchonete. Aliás, só estou trabalhando aqui por isso.

Eu poderia estar na faculdade, porra. Eu poderia estar em tantos outros lugares, mas estou aqui, feito escravo. Sou escravo dos sonhos que não realizei, estou quase desistindo deles. Droga! Meu rosto refletido no espelho do banheiro, mil clientes lá fora. O reflexo me atrai tanto, queria ser Narciso, quem sabe Dorian Gray. Ah, esquece! É só o primeiro dia de trabalho, vamos lá. Acalme-se, Rodolfo. (Isso já virou um mantra, argh.) Mas, na boa, acalme-se. Volte lá, anote os pedidos e transmita tudo ao chapeiro idiota. "Refrigerante e sanduíche, água e vitamina, suco e cerveja. Respectivamente nas mesas 12, 7 e 4, Rafael!" Gritei da porta do banheiro e o cara disse "vá se foder" baixinho, pelo menos não gritou. Sério, que tipo de gente bebe água e vitamina ao mesmo tempo? Povo maluco...

"Hora de ir pra casa, cara. Quer dizer, se quiser beber alguma coisa, falar de futebol e das mulheres que estão passando na rua, pode ficar. Ah, você se saiu muito bem." "Não, não vou ficar. Vou dormir, sei lá, acho que é falta de costume..." Saio da lanchonete fechada, com as mãos nos bolsos e gostando do vento frio no meu rosto. Queria morar longe daqui, pelo menos eu sairia andando pra casa, observando as casas tranquilas durante a madrugada. Se um dos meus amigos me escuta dizer isso, me chamaria de gay. Tenho que deixar de preocupar-me com isso, se eu quiser continuar vivendo, claro. Sei lá, sou estranho mesmo. Ou apenas diferente dos outros. Só gosto de ler os clássicos, os livros idiotas e vez ou outra me arrisco escrevendo. Nada demais, não é? Mas sempre depende do ponto de vista...

Se eu falo isso pra aquela menina ali da janela, acho que ela riria da minha cara, isso sim. "UM CARA QUE É CHAMADO DE GAY, E QUE ESCREVE!" Grande curriculum vitae, Rodolfo. Palmas, você merece. É melhor manter a calma... Calma, calma... Mas ela me olha, queria saber por quais motivos ela faz isso. Veio umas trezentas vezes até a janela. Estava com um celular, depois com um caderno, depois escreveu algo. Olhando pros lados, obviamente tentando disfarçar. Mas você não conseguiu disfarçar, garota. Não dessa vez. É melhor eu ir dormir, descansar um pouco e esquecer da vizinha estranha. Quer dizer, ela não é estranha, só é normal. E estava abraçada com um cara dia desses. Cheguei tarde... Mas esquece, já apaguei a luz e matei meus sonhos. Matei-os até eu abrir os olhos outra vez.

continua...

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