31 de out. de 2012

Vidente

      Quanto tempo faz que eu não te vejo? Eu sempre tenho medo de fazer as contas e me assustar. O tempo tem corrido muito, e eu praticamente te anulei dos meus pensamentos. Porém, nas madrugadas geladas eu sempre sonho contigo. É uma forma de te manter por perto, mesmo que esteja tão longe.
      Você sempre ria do meu ideal de vida. Você falava que ria por me admirar demais. Eu sempre defendi a liberdade, acreditei e ainda acredito na liberdade de todos. O certo é fazer o que o coração pede. Pecado ou não, foi maravilhoso ter feito essa loucura.
      Eu era racional demais, sempre estava me culpando por ter feito isso ou aquilo. Lembra que foi você que me tirou o medo de quebrar regras? Você que me ensinou a esmurrar paredes, defesa pessoal, me ensinou a nadar e centenas de outras coisas. Acho que você não lembra de tudo isso. Mas, pouco importa. Afinal, o teu caminho já estava trilhado, ou você não quis mudá-lo. Eu te entendo, sempre entendi. Pessoas como eu não convivem com pessoas como você. Tão opostos e tão iguais.
      Volta e meia você descrevia um pouco do meu futuro, com um sorriso idiota e olhando pro infinito. Segundo as tuas previsões, quando eu completasse meus trinta anos, eu já deveria estar casada e com uns dois filhos. Eu ri, ri até te deixar constrangido. Ri por saber que isso era completamente impossível. Eu te expliquei que nasci para viver sozinha, então, você me perguntou porque eu estava na sua cama. Eu te disse que não era preciso que você se enganasse ao tentar me enganar. Era só um caso de poucas noites. Acabaria em breve, isso me doía, mas eu não deixava transparecer. Eu estava agindo como se estivesse jogando contigo. Agi como se eu fosse uma pessoa fria, só que eu não era assim. E você sabia disso, tanto quanto eu. Você me conhecia, e poderia me deixar tão frágil como uma criança. Mas é claro que eu nunca permiti. Eu sempre tive mais controle do que eu imaginava.
      Foram uns doze dias juntos, ou quinze, não lembro bem. Depois disso você viajou para um lugar que eu não quis saber o nome. Não sei por onde você anda, eu nunca quis saber. Eu poderia ir atrás de você, eu sei que faria isso se me descontrolasse. Você deve estar muito diferente, se é que ainda está vivo. Isso me dói mais ainda. A ideia de ver você morto sempre me atormentou. E me atormentará para sempre...
      Agora eu estou em uma dessas madrugadas idiotas em que só lembro do meu passado, do nosso passado. Cansada depois de um dia de trabalho, e com uma maldita insônia. Eu já passei dos trinta anos e nunca me envolvi por muito tempo com alguém. Nunca casei, e não tenho filhos. Sabe, eu só queria te ver agora, pra te dizer que você é péssimo em tentar prever o futuro. Eu queria rir da sua cara e te chamar de idiota só mais uma vez. E, de novo, você é um péssimo vidente.

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